Grupo de pesquisa ligado à linha de Comunicação e Política do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Paraná.

Política eleitoral e partidos políticos: demandas e ajustes para o século XXI

O panorama contemporâneo tem sido caracterizado pelo predomínio da midiatização, com a dinâmica de instantaneidade e ubiquidade transcendendo espaços geográficos, possibilitando interações e integrações que também caracterizam o complexo processo de globalização com impactos na política eleitoral. Somada a isto, a crescente produção e consumo de informações tem gerado uma verdadeira anomia quanto a busca de fatos, cada vez mais relegados por suas versões e pelos vieses de interesse a estas associados, tornando a identificação da verdade factual uma dinâmica líquida, fugidia e incerta, o que torna a sociedade da hiperinformação um fenômeno paradoxal de que informação não necessariamente gera conhecimento (OVADAYA, 2018).

Neste cenário, a política, usualmente desacreditada e vinculada a interesses espúrios e pouco transparentes, tem buscado se adaptar para utilizar a comunicação digital. Visa reconstruir sua credibilidade, recorrentemente abalada pela crença na competência dos mercados se autorregularem e gerirem Estados-Nação de modo mais eficiente que o tradicional método da representatividade  feita através dos partidos políticos.

eleitoral

Partidos políticos na comunicação eleitoral

Os partidos políticos representam a união de pessoas que têm objetivos políticos comuns, decorrentes de convicções e propósitos similares, e objetivam o poder  para implementar suas propostas. Ou seja, são formas de agremiação de um grupo social que se propõe a organizar, coordenar e instrumentar a vontade popular, com a finalidade de assumir o poder pelo caminho eleitoral para realizar seu programa de governo (SILVA, 2002, p. 394).

Para que tais agremiações sejam conhecidas pela sociedade, buscam se posicionar perante variados assuntos e construir um posicionamento simbólico que possibilite a sua identificação e associação aos temas e propostas a estes vinculadas. Buscariam, portanto, uma identidade única que facilite a consolidação de uma imagem de marca que tenha reverberação social e eleitoral.

Em termos de posicionamento de marca, a peculiaridade do marketing político é a gama de temas ofertados pelas agremiações (saúde, educação, políticas públicas, segurança, etc.) que tem de ser refletidos em todo o mixde comunicação dos partidos. Assim, propõe-se que o partido político seja a marca corporativa e os políticos sejam o conjunto de representantes que se complementam e dirigem-se a segmentos específicos da sociedade, apontando a estes discursos customizados. Isto sem, entretanto, perder os valores corporativos institucionais que devem representar e reforçar, no somatório dos discursos segmentados, os valores corporativos ou, aplicado à seara política eleitoral, os valores partidários representados em seus estatutos e programas.

Os partidos também enfrentam desafios que potencializam a crise de representatividade na arena parlamentar e governamental, como por exemplo as denúncias de corrupção na conjuntura política atual, que fazem com que a apatia política de grande parcela da população aumente e; as migrações partidárias de parlamentares, que podem acarretar em uma descontinuidade ideológica das ações nos partidos (BRAGA et al, 2015).

Também há oportunidades que são potencializadas pelo uso de tecnologias para o exercício da democracia direta, com estímulo à participação cidadã para o estabelecimento de diretrizes sociais e; o crescimento de movimentos sociais organizados que passam a influir nos posicionamentos de partidos políticos. Ambas tendem a remodelar as funções e estratégias dos partidos a fim de garantir a sua própria sobrevivência num cenário onde ações políticas podem ser realizadas de modo mais direto e participativo, sem que tenham de estar vinculadas a agremiações partidárias. Entretanto, a incorporação destas tendências pode gerar novo impulso. Os partidos podem ser os elos de diálogo efetivos entre interesses e demandas sociais, dinâmicos e difusos, com ações públicas que precisam ser coordenadas para garantir a representatividade da sociedade e a eficiência da administração pública,  equilibrada  entre os vários grupos de pressão a fim de evitar a prevalência de interesses privados em detrimento do conjunto social.

Outros motivos que explicam o porquê de muitos eleitores não se sentirem representados e não confiarem nos partidos políticos no Brasil estão relacionados à pulverização de marcas com pouca diferenciação. Atualmente são 35 partidos políticos existentes de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A profusão de siglas que ocorre durante as coligações partidárias em períodos eleitorais provoca um esmagamento das identidades partidária. Além disso, a personalização de campanhas eleitorais pode acabar tirando o foco dos partidos e conferindo mais atenção aos candidatos e candidatas.

Assim,  é importante que haja uma adaptação aos tempos atuais, para que os cidadãos se sintam representados pelos partidos políticos e para que estes criem novos laços de afetividade e confiança com a população, sem deixar de também atuar nas arenas parlamentar e governamental (MANIN, 1995; KITSCHELT, 2004). A linha a ser perseguida é reforçar os valores com os quais se identificam, devendo representar, de modo prático e consistente, a identidade de marca e consolidar o posicionamento ideológico do partido.

Os partidos políticos podem tentar estreitar os laços com a população, tornando a comunicação mais bidirecional, a partir da utilização de estratégias da Comunicação Integrada de Marketing (CIM), que preveem a utilização de variados suportes à comunicação, como a internet e as redes sociais digitais (KOTLER & KELLER, 2006). De modo que o emprego da CIM, pelas agremiações políticas, estimula uma mobilização maior dos eleitores, além de servir para colocar os cidadãos a par das principais ações dos partidos (DUQUE, 2016). Cabe à CIM fazer com que as mensagens reflitam o mesmo conjunto de valores e ideais adaptando os conteúdos aos diferentes meios que existem atualmente, sejam eles eletrônicos, digitais ou impressos (GEARGEOURA, 2007).

Assim, fica claro que para manter sua representatividade e, consequentemente, sua própria existência, agremiações políticas devem se ajustar para um cenário dinâmico, fluido e interativo da comunicação eleitoral. Devem manter sua relevância social e, para tanto, precisam consolidar marcas fortes que só serão conseguidas com posicionamento claro quanto a temas defendidos. O fato das agremiações escutarem o que a sociedade demanda e inserirem os assuntos na agenda de debate e a edificação de um relacionamento contínuo com a sociedade, baseado em transparência e informação, são estruturantes.

O principal objetivo desta verdadeira campanha permanente é estabelecer uma conexão contínua com os públicos de interesse, mantendo na pauta do debate político os assuntos considerados estratégicos. Assim, se esclarece o posicionamento dos partidos para, através, principalmente, dos meios de comunicação digital, legitimar os atos de governo.

A campanha permanente através das redes sociais digitais favorece o surgimento da Política 2.0, terminologia criada para referir a capacidade de que os políticos e os partidos necessitam atualmente para fomentar o debate com os cidadãos, valorizando os seus comentários e opiniões. Deste modo, a construção do branding partidário encontra bases para se consolidar, visto que o desenvolvimento de plataformas de interação e interconexão com os cidadãos é um dos elementos importantes para criar marcas de partidos fortes. Torna-se mais factual a possibilidade de mensuração dos “humores” da sociedade e a implementação de soluções céleres e efetivas para atender as demandas ou justificar a impossibilidade de implementar ações às mesmas.

O caos da última semana de Maio de 2018, decorrente da greve dos caminhoneiros, mostrou a relevância da comunicação digital na construção de movimentos sociais. Lembre-se que a paralisação foi articulada principalmente por meio de WhatsApp, aplicativo do portfólio da empresa transnacional Facebook. Evidenciou-se uma priorização da lucratividade empresarial em detrimento do interesse público pelo estopim do movimento: aumentos sucessivos do preço do diesel para manter a autonomia da Petrobrás em relação ao governo federal, acompanhando as flutuações do mercado internacional.

Por outro lado, a busca por atores políticos em aquinhoar a visibilidade midiática  conquistada pelo movimento dos caminhoneiros reforça a dinâmica célere da política 2.0que usa as redes sociais como termômetro das demandas sociais a fim de alinhar o discurso e potencializar a aceitação popular e, consequentemente, votos na seara eleitoral. Posturas oportunas ou oportunistas ficam escancaradas quando cruzadas com o histórico de ação parlamentar e reverberam nas bolhas das redes sociais para justificar ou criticar a ação dos postulantes que buscam surfar nas ondas das media storms[1](HARDY, 2018).

Contudo, apesar de encontrar bases para consolidação, o branding partidário não parece ser alvo de interesse das agremiações, pois essas recebem verbas provenientes de fundos eleitorais que mantém os partidos como instituições com um grande viés econômico e não representativo da população. Essa reflexão abre caminho para compreender o real objetivo das agremiações brasileiras na atualidade em termos de campanha eleitoral. Ora elas flertam com o poder econômico para financiar campanhas eleitorais caras, ora flertam com o poder difuso representado por manifestações populares que podem gerar votos.

Esta situação demonstra a dialogia entre  poder corporativo, demandas sociais e partidos políticos. Isto reforça a necessidade de regulação destes atores para a construção de Estados-Nação ágeis e competentes para atender às dinâmicas líquidas e permanentes de uma sociedade em constante mutação, com constante reflexo eleitoral.

Governos responsáveis para responder prioritariamente aos clamores da sociedade e, se possível, também aos interesses mercadológicos, tendem a ser reconhecidos nas urnas, o momento eleitoral por excelência. As eleições são a fronteira final da democracia representativa. A questão é que a representação vem perdendo espaço para a mercadocracia e outras formas de gestão pública que valorizam prioritariamente interesses econômicos em detrimento dos interesses sociais.

[1] Refere-se à explosão na cobertura jornalística sobre um único tema durante um período de tempo.

Autor e autora:

Aryovaldo de Castro AZEVEDO JR, Pós Doutor em Ciências da Comunicação USP, Doutor em Multimeios Unicamp. Professor Associado do Departamento de Comunicação e do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Paraná. Pesquisador coordenador do Grupo de Pesquisa CNPq Comunicação Eleitoral (CEL) vinculado ao Departamento de Comunicação da UFPR. Email: yra68@uol.com.br

Suelen Homrich MOTTA, Mestra em Ciências da Comunicação pelo Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Paraná (PPGCom/UFPR). Publicitária e Professora de Comunicação na FAESP – Faculdade Anchieta. Pesquisadora membro do Grupo de Pesquisa CNPq Comunicação Eleitoral (CEL) vinculado ao Departamento de Comunicação da UFPR. Email: suelenhomrich@gmail.com

 

Referências

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