Em tempos de comunicação digital e a pós-verdade, mais do que nunca, um preceito da comunicação deve ser bem seguido: não deixe dúvidas, comunique com clareza. Nos dias que se seguem à deflagração da operação da Polícia Federal Carne Fraca, a comunicação política da presidência da República traz um bom exemplo de uma ação de marketing que não saiu bem como o esperado.
Em busca de rebater as críticas e melhorar a imagem do Brasil frente aos importadores da carne brasileira, o presidente Michel Temer convidou embaixadores para um churrasco em um tradicional restaurante de Brasília (DF). Do ponto de vista da comunicação governamental, que exige ações mais informativas e sem dubiedade, a ideia soa agressiva. Contudo, se é a criatividade preceito fundamental do marketing, a ação até poderia funcionar. Mas poderia, do futuro do pretérito, tem muitas variáveis e algumas delas saíram longe do esperado.
É nesse ponto que dois outros lados da comunicação, que jamais podem ser esquecidos, se apresentam. O jornalismo político, com seu perfil investigativo, que envolve fontes, furos, cunho social e a missão de mostrar à população aquilo que nem sempre interessa aos grupos políticos que seja publicado. A sequência do jantar na churrascaria que buscava mostrar à população a confiança na carne brasileira rendeu uma matéria em um dos principais jornais do Brasil “O Estado de São Paulo” porém não com o enquadramento desejado pela comunicação governamental. O destaque é o fato de a churrascaria vender carnes importadas.
O segundo ponto, decorrente do primeiro, foi a rápida reação das mídias sociais digitais. A força-tarefa ganhou as redes e memes com a imagem do chefe do Executivo nacional no jantar se multiplicaram. E antes que o dia tivesse fim, a sensação de temor em relação à qualidade produto brasileiro em questão conseguiu ganhar mais força.
Na sequência, as assessorias da churrascaria e do Planalto enviaram notas oficiais esclarecendo que:
1. O estabelecimento também vende carne de uma indústria brasileira investigada;
2. Apesar de a maior oferta ser de carnes importadas, para o presidente e sua comitiva foram servidas carnes brasileiras.
Para a comunicação ou marketing político, fica mais uma lição: tudo, tudo mesmo, deve ser levado em conta no planejamento estratégico. A churrascaria é brasileira (o nome estrangeiro pode dar pistas)? O que servem lá? Qual a fama ou imagem pública que o lugar tem, já que pode ser relacionada diretamente com a dos políticos em questão? Diferente da comunicação de produtos, o marketing político vende ideias e o próprio político, sozinho, pode falar ou fazer algo que desconstrua todo o planejamento adotado, caso não exista coerência entre o que faz e a ideia que deseja passar.
Planejamento é fundamental e a etapa inicial define tudo que vem adiante.
Escrito por: Alice Lima – Mestre e Integrante do Grupo de Pesquisa Comunicação Eleitoral